As estruturas artificiais instaladas nos rios têm como objetivo proteger espécies como o peixe-preto-de-duas-espinhas, após o impacto negativo dos incêndios e dos sedimentos no seu habitat Esta primavera, que para os países do hemisfério sul termina em dezembro, pode ser decisiva nos esforços para preservar o peixe preto com duas espinhas, uma das espécies mais simbólicas da região metropolitana, uma vez que foram instaladas em vários cursos de água estruturas conhecidas como «bungalows» ou «hotéis para peixes», cujo objetivo é fornecer abrigo e locais seguros para a reprodução desta espécie vulnerável.
Se a iniciativa for bem-sucedida, como esperam os ecologistas, não só o Gadopsis bispinosus será salvo, mas também se abrirá um caminho promissor para a recuperação de outras populações de peixes de água doce em risco de extinção em todo o país. Estes exemplares escuros com «bordas brancas nas barbatanas» atingem 25 centímetros de comprimento e habitam pequenas cavidades sob as pedras no fundo dos riachos. Além disso, são criaturas sedentárias, pois «raramente se afastam mais de 15 metros do seu habitat».
No entanto, a sua vida discreta entre as rochas tornou-se uma desvantagem em condições de impacto humano e desastres naturais, uma vez que os sedimentos provenientes da agricultura e da silvicultura alteraram o seu habitat ao longo dos anos. Apesar dos eventos anteriores mencionados, o golpe mais devastador foram os incêndios do verão negro no final de 2019 e início de 2020.

O especialista estima que, naquela época, cerca de 50 mil toneladas de sedimentos foram levados para a bacia do rio Kotter, cobrindo fontes de alimento, abrigos e locais de reprodução. «Esses sedimentos ainda estão lá. A situação está a melhorar, mas pode levar uma década ou mais para que o habitat se recupere», alertou. No entanto, embora a superfície da paisagem pareça ter se recuperado, a realidade subaquática é bem diferente. «A paisagem terrestre está verde e parece ótima, e todos pensam que o trabalho está feito, mas debaixo de água está em péssimas condições», explicou o ecologista.
Além disso, o monitoramento anual após os incêndios mostrou uma redução de 80 a 90% na população de peixes pretos na bacia superior do Kotter; na primavera de 2020, foi registada a reprodução, mas os juvenis não sobreviveram. «Eles não se reproduziram com sucesso durante quatro anos após os incêndios», explicou Beitzell. «Ficámos com uma população de indivíduos adultos muito grandes. Estávamos preocupados que eles começassem a morrer naturalmente e começássemos a perder a população. A sua recuperação estava à beira do abismo.»
O papel dos «bungalows» aquáticos
As primeiras observações mostram que os peixes pretos utilizam e reproduzem-se perto destas estruturas. Utilizados com sucesso em várias partes do mundo para diferentes espécies, os chamados hotéis para peixes são pequenas estruturas piramidais de madeira, fixadas ao fundo dos rios com grandes pedras. «Provavelmente não teriam funcionado, porque o peixe preto prefere pedras a madeira», reconheceu Beitzell. Por isso, a equipa decidiu alterar o design e criar nove «bungalows para peixes pretos», combinando a forma de cabana dos hotéis tradicionais com um enchimento de pedras, imitando as fendas naturais entre as pedras. Os resultados preliminares são animadores, pois, de acordo com as informações recebidas, na época de reprodução de 2024 as condições climáticas foram favoráveis e, segundo eles, os bungalows podem ter desempenhado um papel decisivo.
Futuro incerto para os peixes de água doce

Os ecologistas estão a instalar estruturas artificiais nos rios da região da capital para proteger espécies em extinção. Ao mesmo tempo, o biólogo Ben Brodhurst, da Universidade de Canberra, acredita que os bons resultados podem estar mais relacionados com fatores ambientais do que com os bungalows. «Na minha opinião, os hotéis para peixes provavelmente tiveram um papel insignificante, se é que tiveram algum», disse ele, citado pela ABC.
Segundo o especialista, «os fatores mais prováveis foram as condições climáticas e de corrente favoráveis, bem como a redução do número de trutas predadoras». Portanto, o período de acasalamento nesta primavera será decisivo para determinar se as «altas» construções realmente ajudam a salvar a espécie ou se os resultados de 2024 foram apenas uma coincidência. Neste contexto delicado, num relatório publicado em dezembro do ano passado na revista académica Biological Conservation, foi demonstrado que 37% dos peixes de água doce que habitam a Austrália estão ameaçados ou à beira da extinção, e concluiu-se que «é necessário adotar urgentemente medidas concretas para a conservação da espécie, a fim de evitar o seu inevitável desaparecimento».
O especialista concorda que inovações como os bungalows não são uma «solução milagrosa», mas sim um componente valioso de uma abordagem abrangente. «Eles são apenas parte de um mosaico muito maior, que inclui a gestão de bacias hidrográficas, a restauração do caudal e o controlo de espécies invasoras», observou. O especialista alertou que a situação geral é «realmente grave». «Sem medidas concretas, muitas dessas espécies correm um risco real de extinção. É por isso que inovações como hotéis para peixes e refúgios especiais para espécies específicas são tão importantes», concluiu ele em entrevista à ABC.
