Investigadores transformam cogumelos shiitake em microchips de memória capazes de processar até 5850 sinais por segundo

Biochips feitos de cogumelos competem com semicondutores tradicionais Os shiitakes podem ser os protagonistas da culinária asiática, mas agora também estão a marcar um marco no desenvolvimento da tecnologia eletrónica sustentável. Uma equipa de investigadores da Universidade demonstrou que estes cogumelos podem funcionar como processadores vivos, capazes de armazenar e extrair dados de forma muito semelhante aos chips convencionais. mas sem poluir o ambiente.

Tecnologia inspirada na natureza

Os dispositivos desenvolvidos baseiam-se no conceito de memristor, um componente que «memoriza» a quantidade de corrente que passa por ele, alterando assim a sua resistência. Os memristores tradicionais requerem materiais como óxidos metálicos e processos de produção altamente poluentes. Em contraste, os memristores desenvolvidos com micélio de cogumelos podem crescer à temperatura ambiente, sem o uso de elementos de terras raras, e ser compostados no final da sua vida útil. E o mais interessante: eles funcionam. A equipa descobriu que, após a desidratação e conexão ao circuito, o micélio shiitake pode se comportar como um memristor orgânico, capaz de operar em frequências de até 5850 Hz com uma precisão de comutação de 90%. Em baixas frequências, a precisão chega a 95%.

Redes miceliais: muito mais do que apenas cogumelos

O micélio não é apenas um material passivo. É uma rede viva e complexa que reage a estímulos elétricos, transmite sinais e tem a capacidade de se autorregenerar. Em certo sentido, ele se comporta como uma rede neural primitiva. Essa qualidade o torna uma interface ideal para tecnologias bioeletrónicas: sensores ambientais, controladores biocompatíveis ou até mesmo formas básicas de inteligência artificial descentralizada. Alguns laboratórios europeus, como o Unconventional Computing Lab da Universidade da Inglaterra Ocidental, já investigam há muitos anos como o micélio pode ser usado como um sistema de processamento paralelo. Novos testes realizados em Ohio mostram que essas ideias podem ser ampliadas e aperfeiçoadas.

Impacto no ambiente e na sociedade

Enquanto os chips de silício exigem mineração intensiva, emissões e resíduos não recicláveis, os biochips de micélio podem ser cultivados a partir de resíduos orgânicos com consumo de energia quase nulo. Além disso, esse tipo de tecnologia é acessível, o que abre oportunidades para comunidades rurais, investigadores independentes e iniciativas educacionais. Num mundo saturado de dispositivos eletrónicos obsoletos — segundo a ONU, em 2024, o volume global de lixo eletrónico ultrapassou 59 milhões de toneladas — essa alternativa não é apenas promissora, mas também urgentemente necessária.

Paralelamente, na Alemanha e na Holanda, já está a ser avaliada a utilização de micélio para revestimentos eletrónicos, materiais isolantes biodegradáveis e até mesmo sistemas de recolha de energia do ambiente.

Potencial

A utilização de cogumelos na tecnologia não é ficção científica. É um caminho real para:

  • Uma redução drástica do impacto da indústria eletrónica no ambiente.
  • Desenvolvimento de dispositivos compostáveis que, após o uso, são reintegrados no ecossistema.
  • Criação de sensores vivos para monitorização do ambiente, capazes de detectar poluição, humidade ou mudanças de temperatura.
  • Projeto de sistemas inteligentes com baixo consumo de energia, independentes de grandes infraestruturas.
  • Democratização da tecnologia: qualquer pessoa com conhecimentos básicos poderia cultivar os seus próprios componentes.

Imaginemos sensores distribuídos por hortas urbanas que detetam os níveis de azoto e regulam a rega, ou estruturas miceliais que reagem ao calor e atuam como sistemas de ventilação passivos. Poderíamos até ver redes descentralizadas de processamento de dados, baseadas no crescimento natural, a desenvolver-se em conjunto com o seu ambiente. O micélio pode não só mudar a forma como fazemos cálculos. Pode ensinar-nos a repensar a nossa relação com a tecnologia: menos velocidade, mais sustentabilidade. Menos resíduos, mais regeneração.

Alisia Pereira/ author of the article

Escrevo artigos, partilho ideias simples que tornam a vida mais fácil.

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